A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) que investiga os danos socioambientais dos grandes projetos na Bacia do rio Pará votou nesta terça-feira, dia 4, o parecer do relator, deputado Celso Sabino (PSDB). O documento recebeu contribuições do deputado Carlos Bordalo (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Alepa, membro da CPI, e foi discutido em reunião administrativa. Em seguida, os parlamentares apresentaram um resumo do relatório em reunião aberta no Auditório João Batista, que estava lotado de lideranças e moradores das áreas atingidas em Barcarena, Itaituba e região das ilhas. O relatório final da CPI será apresentado em plenário e divulgado na íntegra no próximo dia 18.
Presidida pelo deputado Coronel Neil, a CPI Barcarena foi instalada após denúncias de vazamento de rejeitos da empresa norueguesa Hydro Alunorte, maior refinaria de alumina do mundo, entre os dias 16 e 17 de fevereiro, em Barcarena. A Comissão de Direitos Humanos realizou logo em seguida uma diligência ao local para ouvir as comunidades atingidas. A CPI foi instalada na sequência, formada ainda pelos deputados Eliel Faustino (DEM), Soldado Tércio (PROS), Miro Sanova (PDT) e José Skaff (MDB).
Em nove meses de trabalho, foram realizadas 23 oitivas, ouvindo 55 depoimentos, entre autoridades governamentais, das esferas estadual e municipal, moradores das comunidades afetadas, pesquisadores, cientistas, advogados, médicos, diretores de órgãos ambientais e funcionários das empresas Hydro Alunorte e Imerys. A última oitiva foi a do vice-presidente executivo da área de negócios de Bauxita e Alumina da Hydro, John Thuestad. Apenas uma oitiva foi feita em caráter privado, a dos funcionários da Hydro que estavam trabalhando nos dois dias do vazamento. As demais oitivas foram transmitidas ao vivo pela Rádio e TV Alepa.
Para o deputado Bordalo, a presença de lideranças e moradores das comunidades na Alepa no dia da votação do relatório foi simbólica. “Se existe algo que me incomoda em todo este processo é a invisibilidade de vocês no ciclo minerário do Pará, ainda marcado pela exclusão das minorias e pela completa ausência de sensibilidade com aqueles que são afetados por esse bilionário processo de extração de riquezas. A mineração tem sido um grande canal de enriquecimento e extração de riquezas, mas não tem resultado em retorno real para o povo paraense. Seja nas áreas de onde se extrai ou se beneficia o minério, o que se vê, dia após dia, são abundantes riquezas saindo do Estado, sem a melhoria da qualidade de vida dos nossos paraenses que vivem ao redor desses projetos. Pelo contrário, e como esse relatório aponta, as populações são atingidas de forma continuada por contaminações, que ceifam centenas de vidas”, declarou.
O parlamentar ressaltou que o relatório, embora extenso, ainda se mostra insuficiente, devido a complexidade do quadro, mas ao mesmo tempo é o mais avançado posicionamento do poder legislativo paraense sobre o processo minerário no Estado. “Finalmente vamos colocar luzes sobre esse complexo minero-metalúrgico de Barcarena”, disse ele, lembrando que foi durante a CPI da Alepa que, pela primeira vez, uma multinacional teve que prestar contas ao povo do Pará sobre suas atividades. “Essas empresas se instalam como se fossem um Estado dentro do Estado, nos tratam como colonizados, se acham um governo superior aos nossos governos”, criticou.
Bordalo explicou que já existe um termo de compromisso firmado entre o Governo do Pará e a Hydro para implementar um plano de desenvolvimento urbano em Barcarena, com recursos de R$ 150 milhões (saiba mais aqui). Além disso, existe o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado pela Hydro com o Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) e Governo do Estado, chancelado pela Justiça (saiba mais aqui).
“E agora o nosso relatório reúne um conjunto de recomendações e penalizações, mas também uma visão para o futuro. É preciso dizer que não somos contra as mineradoras e os empregos gerados, mas não podemos aceitar a geração de emprego a qualquer custo. Não somos o almoxarifado do mundo, e não podemos ficar somente com as doenças e os danos ambientais”, destacou. Bordalo fará parte de uma comissão parlamentar de acompanhamento do cumprimento dos acordos e recomendações previstos.
Paulo Feitosa, representante das comunidades de Barcarena, lembrou que há mais de duas décadas a população vem sofrendo as consequências dos grandes projetos na região. “Já foram mais de 20 acidentes ambientais sem que ninguém fizesse nada por nós. A primeira audiência pública só foi realizada em 2011 e reuniu mais de cinco mil pessoas. É uma situação muito grave e existe muita gente doente”, disse ele, afirmando que existem mais de 80 comunidades atingidas e que não estariam dentro do TAC assinado pela Hydro. “Precisamos que alguém olhe por nós”.
Bartira Santos, da Associação dos Barraqueiros da praia de Beja, em Abaetetuba, disse que há três anos não se pode mais comprar peixe e nem camarão no município devido à contaminação. “Temos que vir comprar esses produtos em Belém, porque o freguês não quer mais nada de lá. E porque não somos de Barcarena, nunca recebemos um litro de água mineral, embora nossa água também esteja contaminada. Minha família vive doente e cheia de coceira, e sabemos que até a água da chuva é imprópria para o nosso consumo”.